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A Canção para Crianças – que canção é essa?

Por Rosy Greca

Parte 1 – Para começar

É comum denominarmos toda a canção que se relaciona com a infância de canção infantil. O adjetivo “infantil” particulariza o público a que a canção se destina dando origem a este gênero de canção.

A canção infantil compreende três modalidades: canção para crianças, canção folclórica ou tradicional e a canção infantil propriamente dita.

Esta distinção existe em função da figura do cancionista, aquele que cria a canção. Enquanto a primeira pressupõe a presença de um cancionista adulto, reconhecido como autor da canção e que se dirige intencionalmente ao público infantil, a segunda provém de um cancionista anônimo e a terceira é composta pela própria criança.

O presente trabalho trata especificamente da canção para crianças – ou canção de autor, como preferem alguns –, pelo fato de ser este o campo da canção infantil onde desenvolvo a minha experiência profissional.

A canção para crianças é uma canção protagonizada por três figuras essenciais: o cancionista adulto, o intérprete e a criança. Antes de refletir sobre cada uma delas, falarei brevemente sobre o cancionista e a canção – esta última, uma expressão humana presente em todos os tempos e culturas e que, segundo Ruth Finnegan, em seu ensaio O que vem primeiro: o texto, a música ou a performance? “pode ser considerada um dos verdadeiros universais da vida humana” (MATOS, TRAVESSOS e MEDEIROS, 2008, p.15).

Ao contrário do que muitos pensam, a canção não é um gênero musical, tampouco literário. É uma categoria de linguagem, assim como a música e a literatura, como afirma Luiz Tatit, em sua obra Semiótica da Canção: Melodia e Letra (TATIT, 1994).

Segundo pesquisas contemporâneas oriundas de diversas áreas que lidam com a palavra cantada (música, letras, etnomusicologia, etnopoética, etnografia da fala, entre outras), a canção é um fenômeno complexo que compreende três dimensões: letra, música e performance, esta última atualizada na voz humana. Como diz Ruth Finnegan, “…para analisar a palavra cantada precisamos entendê-la como performatizada, encenada por meio da voz – afinal, o canto é em si próprio entendido como um marcador de “performance’” (FINNEGAN, 2008, p.19).

A canção, portanto, aglutina as linguagens da literatura e da música, bem como da voz em performance, a qual é responsável pela materialização (audibilidade) da canção.

Entendo por cancionista o compositor de canções. Não necessariamente compositor musical ou poeta, o cancionista raramente possui estudos acadêmicos musicais ou literários. Luiz Tatit, em seu artigo Cancionistas Invisíveis (TATIT, 2006, p.54-58) apregoa que “onde houve língua e vida comunitária, houve canção. Enquanto houver seres falantes, haverá cancionistas convertendo suas falas em canto”.

 

Isto não significa, porém, que a canção deixe de requerer “um artesanato específico para se criar boas relações entre melodia e letra” (TATIT, 2006, p.54). Um bom poeta não necessariamente é um bom letrista. Um bom músico não necessariamente logra musicar o texto com habilidade e talento. Lembremos novamente Luiz Tatit ao referir-se à composição cancional:

Trata-se, portanto, de uma habilidade específica que muitas vezes é confundida com formação musical ou literária… Normalmente, nossos grandes autores […] passam ao largo das áreas letradas e nem por isso compõem com menos freqüência ou com menos requinte técnico, muito pelo contrário. Todos eles […] chegaram a uma produção de excelência não só por evidente vocação, mas, sobretudo, porque se entregaram com afinco ao ofício de fazer canção. (TATIT, 2006, p.54)

Portanto, o cancionista é aquele que compõe canções (letra e música), seja ele profissional ou não.

Por outro lado, quando a um poeta ou letrista se junta o músico, temos as parcerias. No campo da canção para crianças, temos parcerias maravilhosas como Vinícius de Moraes e Toquinho (A Arca de Noé), Chico Buarque, Sérgio Bardotti e Luiz Enriquez (Os Saltimbancos), Sandra Perez e Paulo Tatit (Selo Palavra Cantada), entre outras de igual importância e representatividade.

Feitas as considerações acerca da canção e do cancionista, sigo apresentando algumas reflexões preliminares sobre o cancionista para crianças, o intérprete, a criança e a canção para crianças.

 

Autora: Rosy Greca, integrante da equipe pedagógica da Cântaro.

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