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A partir do início do século XX, definir música e seus caminhos pedagógicos tornou-se uma tarefa difícil e extremamente complexa. Se, até então, a música ocidental europeia, com seus cânones, regras, códigos e pressupostos teóricos, nos servia de referência para a produção musical e para o ensino da música, o fenômeno da globalização e as novas descobertas ocorridas ao longo do século XX nos campos da economia, tecnologia, antropologia, psicologia, neurociência, entre outras áreas do conhecimento, deram origem a uma verdadeira revolução no pensamento musical, no que se refere à criação, a produção, ao ensino e a aprendizagem da música. Novos paradigmas apontam para novas formas de atuação do artista e do professor diante dos desafios inerentes aos ofícios de fazer e ensinar música.
É preocupante observar que, não obstante as profundas transformações nessas áreas, o ensino da música, na maioria das escolas especializadas e escolas regulares brasileiras, ainda se fundamenta em cânones, princípios e metodologias do passado.
Em especial, a música erudita contemporânea foi a que mais se fez influenciar e também influenciou os novos paradigmas, abrindo inusitadas possibilidades na arte da música e, principalmente, no campo da pedagogia musical. Novas e infinitas perspectivas se abriram para a arte e o ensino da música, tais como:
– A ampliação das formas de percepção sonora;
– A ideia de música e corporalidade;
– A inserção do ruído como possibilidade sonora;
– A valorização do timbre e do silêncio, elementos até então eclipsados pelo reinado do ritmo, melodia e harmonia da música clássica europeia;
– A influência da música de outras culturas como: a aborígene, a africana, a oriental, entre outras;
– A pesquisa sonora e a construção e execução de instrumentos criados a partir de materiais diversos, relativizando a necessidade imperiosa dos instrumentos musicais tradicionais para se produzir música;
– O multi/interculturalismo e a diversidade musical;
– O uso da tecnologia;
– O uso de novas formas de representação simbólica da linguagem musical;
– O protagonismo do aluno no processo de criação, execução e produção musicais, entre outras possibilidades.

Não se pode perder de vista, no entanto, que o conhecimento construído e acumulado historicamente pelo ser humano tem seu valor, juntamente com os processos individuais e coletivos de descoberta, de construção e de reconstrução dos saberes no tempo presente.
Nesse sentido, a própria arte musical se reinventa todos os dias, seja em seu fazer, em seus conceitos e, em especial, na perspectiva da arte enquanto caminho educativo.
Por esta razão, faz-se prudente que, diante de tantas transformações e variáveis no fazer e perceber a música, as proposições educacionais sejam abertas e dinâmicas, isto é, sem conceitos fechados e um constante campo de renovação. Em outras palavras, a educação musical contemporânea, metodologicamente, pode se assumir de maneira híbrida, em que se permitem diálogos entre presente e passado, prospecções futuras, conjunções de várias linguagens artísticas, misturas de poéticas e estéticas, enfim, uma gama de possibilidades que não se contrapõem necessariamente, se complementam sempre à luz de cada contexto onde se pensa e se faz arte, música.

Este texto é um fragmento do Plano Político Pedagógico (PPP) da Cântaro, concebido por Rosa Maria Michel, Rosy Greca, Mara Fontoura e Lydio Roberto.

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